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2.5.09

A CLAREIRA DOS ESQUECIDOS - Terceira parte


A CLAREIRA DOS ESQUECIDOS
Terceira parte

Henry Evaristo


Primeiro senti náuseas, depois um formigamento que percorria todo meu corpo. Só então veio o cheiro, o terrível cheiro que me pôs de pé novamente!

Era como o odor de animais mortos, largados em alguma ravina, meio imersos em poças de sangue coagulado. Nada menos que isso poderia descrever o horror que penetrava por minhas narinas.

Quando sentei-me na cama, completamente atordoado, não via nada diante de mim além de minha própria agonia. Só o correr do tempo me fez capaz, novamente, de discernir o ambiente ao meu redor. A escuridão não se fora e, lá fora, as trevas da noite grassavam ainda mais. Tudo era silencio e imobilidade. Mas havia algo no quarto que se movia. Uma sombra retilínea, como a de um homem muito alto que, como um lagarto, se esgueirasse verticalmente pelas paredes.

Fiquei apenas sentado, olhos fixos na aparição, em meio ao cheiro de morte asquerosa; e ela guiou meu olhar movendo-se de cima para baixo até alcançar o alto do guarda-roupa. Ali, desgrudou-se da superfície áspera em que estava e pousou, ta qual um pássaro agourento, sobre o móvel. Havia então outra criatura ao seu lado. E ainda outras pousadas no chão! Como estranhas e monstruosas feras aladas, elas pareciam confabular, e soltavam piados horrendos quando queriam se fazer entender. Às vezes olhavam para mim, com seus olhos terríveis, e eu podia entender que algo malévolo motejava em suas entonações.

Jamais me tocaram, aqueles primeiros que surgiram, ou mesmo se dirigiram a mim diretamente. Eram como predadores inteligentes que analisavam a presa e todas as suas possibilidades. Olhavam para mim, para a cama e depois para todos os lados. Em meio à escuridão, pude ver que se vestiam com roupas escuras, estranhas; feitas com algum tecido que me era desconhecido. Não eram todos altos como o que viera pelas parededes e, dentre os cinco ou seis que por meu quarto passaram naquela noite, pude notar que alguns eram de estatura igual ou inferior à minha.

Aos poucos eles iam se reunindo em meio às sombras de um canto do guarda-roupa, como ratos agrupados num nicho de esgoto. Seus grunhidos eram agudos e mórbidos, como os de alguns tipos de coruja. Seus olhos, arredondados e amarelados, como os de algumas aves.

De repente, todos de uma vez se voltaram para a porta do quarto. Dali vinha algo. E, em meio ao meu horror extremo, vi ceder a entrada sob terrível força descomunal. Vindo abaixo a peça de madeira, irrompeu um ser dos mais terríveis pesadelos. Algo ave, algo homem, algo morcego. Uma fera saltada das mais profundas fendas do inferno. E o cheiro maldito que a tudo infestava, era dele que emanava.

Dirigindo-se a mim, impossibilitado de me mover, aquela coisa se aproximou com um som de garras que raspavam o soalho. E tudo terminou bem rápido.

Com uma de suas mãos...ou patas, ela me estendeu um livro. E depois, antes de desaparecer levando consigo seus asseclas demoníacos, disse me olhando nos olhos:

“Homem, se queres vingar aqui, toma! Lê! E nos Serve! Se não...”

E assim desapareceu como se nunca ali estivera.

Fiquei sozinho com meu horror, com minhas impressões alucinadas, com meus nervos destruídos. E assim veio a manhã do terceiro dia.


(Continua)

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