Autora Renata Draven estréia como colaboradora da Câmara dos Tormentos com uma ótima releitura do mito que tem assustado gerações de crianças no mundo inteiro. Boa leitura!
EMBAIXO DA CAMA
Renata Draven
Começou como um medo infantil qualquer. Ele tinha três anos e não dormia sem que antes os pais olhassem debaixo da cama. Posteriormente, passou a não querer mais adormecer com as luzes apagadas, o que deixava o pai, um economista, muito enfurecido ao ver as contas de luz no fim do mês. A mãe intervinha, a favor do filho: "deixe estar, é só uma fase".
Mas os anos se passaram.
O menino já tinha sete anos, porém sua fobia do escuro e de algo incompreensível que alegava existir debaixo da cama continuava.
Os pais levaram o menino a muitos psicólogos - nenhum conseguiu descobrir de que ele sofria - assim, as luzes continuavam acesas à noite, e o fundo da cama continuava a ser inspecionado minuciosamente.
Mudaram a cama de lugar, mudaram o menino de quarto, mas o medo continuava, cada vez mais forte.
Um dia, o pai teve uma idéia - tratamento de choque - ele dissera.
Às nove horas, o pai saiu e desligou a energia da casa, simulando um blackout.
A mãe fingiu não encontrar velas ou fósforos, e foi com dor no coração que conduziu o choroso filho ao quarto. Colocou a criança na cama - ele estava apavorado e pedia desesperadamente à mãe que ficasse por ali. A mãe endureceu o coração e disse que não, saindo, com pena e fechando a porta.
O menino ficou ali, sozinho, com seu maior medo. Ele estava paralisado, gelado de pavor. Não tinha força sequer para se levantar e sair correndo.
Ele continuou parado, alerta, olhos arregalados, adrenalina fluindo.
O relógio da sala deu dez badaladas. O menino continuava atento - ouvia os pais conversando na sala.
O relógio da sala deu onze badaladas. Agora ouvia apenas os sons noturnos: uma sinfonia de grilos e o silêncio mórbido que a noite trazia.
O relógio da sala deu doze badaladas. Afinal, o menino foi se acostumando ao silêncio e à escuridão e foi entregando-se ao cansaço. Suas pálpebras iam se fechando quando ele ouviu um barulho - vindo de debaixo da cama. Despertou sobressaltado. Uma mão de unhas longas e pele áspera agarrou-lhe o tornozelo.
tentou gritar, sem sucesso. A voz não lhe saía. Não tinha forças para se livrar daquela criatura ressequida e horrenda que tentava arrastá-lo para debaixo da cama. Tentou ainda agarrar-se ao tapete - em vão.
Olhou para trás e divisou o rosto grotesco de olhos brilhantes e presas pontiagudas que sorria para ele. Foi arrastado e mergulhou na escuridão, chorando...
...
Ele não entendia o que havia acontecido - acordou no escuro, embaixo da cama. Tentou sair e percebeu que aquele não era o seu quarto - viu que neste as paredes eram cor de rosa e havia ursinhos de pelúcia.
Colocou a mão para fora, tateando na escuridão e encontrou um tornozelo fino.
Olhou em cima da cama e viu uma menina de cabelos negros, que o fitava com os olhos enormes cheios de terror.
Só então reparou nas suas mãos: outrora infantis e claras, elas agora pareciam ressequidas e cobertas de veias salientes, com enormes unhas negras.
Tentou dizer à assustada garotinha que precisava de ajuda, mas descobriu que não tinha mais voz. O máximo que conseguia fazer era sorrir, grunhir e assoviar com sua língua bifurcada e seus dentes pontiagudos. Nesse momento, a garotinha começou a gritar...
Sem escolha, para fazê-la calar-se, ele a puxou, arrastando-a para a escuridão.
Horrorizado, percebeu que encontrou conforto e prazer em arrastar outra criança para a mesma situação que vivera.
Um ricto horrível tomou conta de sua face disforme, e rastejando na escuridão, o antigo menino que tinha medo do desconhecido pensou: "nada mal para o meu primeiro dia como o monstro debaixo da cama".
Mas os anos se passaram.
O menino já tinha sete anos, porém sua fobia do escuro e de algo incompreensível que alegava existir debaixo da cama continuava.
Os pais levaram o menino a muitos psicólogos - nenhum conseguiu descobrir de que ele sofria - assim, as luzes continuavam acesas à noite, e o fundo da cama continuava a ser inspecionado minuciosamente.
Mudaram a cama de lugar, mudaram o menino de quarto, mas o medo continuava, cada vez mais forte.
Um dia, o pai teve uma idéia - tratamento de choque - ele dissera.
Às nove horas, o pai saiu e desligou a energia da casa, simulando um blackout.
A mãe fingiu não encontrar velas ou fósforos, e foi com dor no coração que conduziu o choroso filho ao quarto. Colocou a criança na cama - ele estava apavorado e pedia desesperadamente à mãe que ficasse por ali. A mãe endureceu o coração e disse que não, saindo, com pena e fechando a porta.
O menino ficou ali, sozinho, com seu maior medo. Ele estava paralisado, gelado de pavor. Não tinha força sequer para se levantar e sair correndo.
Ele continuou parado, alerta, olhos arregalados, adrenalina fluindo.
O relógio da sala deu dez badaladas. O menino continuava atento - ouvia os pais conversando na sala.
O relógio da sala deu onze badaladas. Agora ouvia apenas os sons noturnos: uma sinfonia de grilos e o silêncio mórbido que a noite trazia.
O relógio da sala deu doze badaladas. Afinal, o menino foi se acostumando ao silêncio e à escuridão e foi entregando-se ao cansaço. Suas pálpebras iam se fechando quando ele ouviu um barulho - vindo de debaixo da cama. Despertou sobressaltado. Uma mão de unhas longas e pele áspera agarrou-lhe o tornozelo.
tentou gritar, sem sucesso. A voz não lhe saía. Não tinha forças para se livrar daquela criatura ressequida e horrenda que tentava arrastá-lo para debaixo da cama. Tentou ainda agarrar-se ao tapete - em vão.
Olhou para trás e divisou o rosto grotesco de olhos brilhantes e presas pontiagudas que sorria para ele. Foi arrastado e mergulhou na escuridão, chorando...
...
Ele não entendia o que havia acontecido - acordou no escuro, embaixo da cama. Tentou sair e percebeu que aquele não era o seu quarto - viu que neste as paredes eram cor de rosa e havia ursinhos de pelúcia.
Colocou a mão para fora, tateando na escuridão e encontrou um tornozelo fino.
Olhou em cima da cama e viu uma menina de cabelos negros, que o fitava com os olhos enormes cheios de terror.
Só então reparou nas suas mãos: outrora infantis e claras, elas agora pareciam ressequidas e cobertas de veias salientes, com enormes unhas negras.
Tentou dizer à assustada garotinha que precisava de ajuda, mas descobriu que não tinha mais voz. O máximo que conseguia fazer era sorrir, grunhir e assoviar com sua língua bifurcada e seus dentes pontiagudos. Nesse momento, a garotinha começou a gritar...
Sem escolha, para fazê-la calar-se, ele a puxou, arrastando-a para a escuridão.
Horrorizado, percebeu que encontrou conforto e prazer em arrastar outra criança para a mesma situação que vivera.
Um ricto horrível tomou conta de sua face disforme, e rastejando na escuridão, o antigo menino que tinha medo do desconhecido pensou: "nada mal para o meu primeiro dia como o monstro debaixo da cama".