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20.8.07

A GUERRA DOS MUNDOS (continuação)

LIVRO I - CAPÍTULOS VII; VIII; IX & X
VII
COMO CHEGUEI A CASA

Por meu lado, não me lembro de nada da minha fuga, com excepção da violência com que embatia nas árvores e do facto de cambalear enquanto corria através do urzal. Tudo em meu redor sugeria e aumentava o terror invisível dos marcianos; a impiedosa espada de calor parecia voltear de um lado para o outro, floreando por cima da minha cabeça antes de descer e me aniquilar. Entrei na estrada num ponto situado entre a encruzilhada e Horsell, e corri em direcção à encruzilhada. Por fim, não pude continuar; estava exausto devido à intensidade das minhas emoções na fuga; cambaleei e caí à beira da estrada. Isto aconteceu ao pé da ponte que atravessa o canal que ficava perto das fábricas de gás. Caí e fiquei imóvel.

Devo ter permanecido ali bastante tempo.

Levantei-me, perplexo. Durante alguns momentos não consegui compreender com clareza como tinha chegado ali. Despira-me do meu terror como de uma peça de roupa. O chapéu desaparecera e o colarinho desprendera-se do botão. Alguns minutos antes só havia três coisas reais para mim - a imensidade da noite, do espaço e da natureza, a minha fraqueza e angústia e a proximidade da morte. Agora, era como se qualquer coisa tivesse mudado e os meus pontos de vista se tivessem alterado bruscamente. Não houvera nenhuma transição sensível de um estado mental para o outro. Voltara, bruscamente, a ser o mesmo de todos os dias - um cidadão decente, vulgar. O baldio silencioso, o impulso que me levara a fugir, as chamas, pareciam-me um sonho. Perguntava a mim mesmo se estas últimas coisas tinham, na realidade, acontecido. Mal podia acreditar.

Ergui-me e dirigi-me despreocupadamente para a ponte. Tinha o espírito livre de preocupações, mas levava os músculos e os nervos exaustos. Vacilava como se estivesse embriagado. Vi uma cabeça aparecer sobre o arco e surgir a figura de um operário com uma cesta. Ao lado dele corria um rapazinho. Passou por mim, desejando-me boa-noite. Lembrei-me de falar com ele, mas não o fiz. Respondi à sua saudação com um murmúrio sem sentido e continuei.

Sobre o arco de Maybury rolava um comboio - um tumulto revolto de fumo branco, em chamas, e uma comprida “lagarta” de janelas iluminadas, rodando para o sul -, pouca-terra, pouca-terra, e desapareceu. Um grupo indistinto de pessoas conversava ao pé do portão de uma das bonitas casas da pequena rua... a que se chamava Oriental Terrace. Era tudo tão real e tão familiar! E aquilo que se achava atrás de mim! Algo demasiado fantástico! Coisas dessas, dizia a mim mesmo, não podiam existir.

É provável que eu seja um homem de carácter excepcional. Não sei até que ponto a minha experiência é vulgar. Às vezes, sofro de uma estranha sensação de afastamento de mim mesmo e do mundo que me cerca: parece-me que observo tudo de fora, de algum sítio inconcebivelmente afastado, longe do tempo e do espaço, onde estão ausentes a tensão e a tragédia que rodeiam todas as coisas. Esta sensação mostrava-se muito pronunciada nessa noite; era outra faceta do sonho em que me achava mergulhado.

Mas o problema residia na completa incongruência desta serenidade e na morte rápida, além, a menos de três quilómetros.

Ouvia-se o ruído produzido pelas fábricas de gás e as lâmpadas eléctricas estavam acesas. Detive-me perto do grupo de pessoas.

- Quais são as notícias do baldio? - perguntei.

Encontravam-se dois homens e uma mulher junto do portão.

Hem? - exclamou um dos homens, voltando-se.

Quais são as notícias do baldio? - repeti.

Mas o senhor não esteve lá? - perguntaram os homens.

As pessoas que se encontram no baldio parecem doidas varridas - disse a mulher, do outro lado do portão. - Que é que se passa?

Não ouviu dizer nada acerca dos homens que vieram de Marte? - perguntei. - As criaturas vindas de Marte?

Ouvi o bastante - respondeu a mulher, por cima do portão. - Obrigada. - E começaram a rir.

Senti-me ridículo e zangado. Tentei contar-lhes o que vira, mas descobri que isso era impossível. Riram-se de novo enquanto eu pronunciava frases entrecortadas.

- Ainda hão-de ouvir mais - disse, e continuei o meu caminho para casa.

A minha mulher sobressaltou-se quando a encontrei no limiar da porta, tão desfigurado estava. Penetrei na sala de jantar, sentei-me, bebi algum vinho e, mal readquiri o equilíbrio, contei-lhe o que vira. O jantar, que estava frio, já fora servido, ficando esquecido na mesa enquanto contava a minha história.

Há um facto importante - disse eu, para suavizar os receios que provocara -, eles são as coisas mais vagarosas que alguma vez vi. Podem ficar no fosso e matar as pessoas que se aproximarem, mas não podem sair dele. Mas são tão horríveis!

Não penses mais nisso, querido!-disse minha mulher, franzindo as sobrancelhas e pousando uma das mãos sobre a minha.

Pobre Ogilvy! - exclamei. - Pensar que pode estar ali morto!

Por fim, a minha mulher acabou por acreditar no que eu lhe contava. Quando vi o seu rosto empalidecer mortalmente, calei-me de súbito.

- Eles podem vir para aqui - dizia ela, sem cessar.

Obriguei-a a beber vinho e tentei animá-la.

- Mal se podem mexer - tranquilizei-a.

Comecei a reconfortá-la e a mim mesmo, repetindo tudo quanto Ogilvy me dissera acerca da impossibilidade de os marcianos se estabelecerem na Terra. Em particular, salientei as dificuldades criadas pela maior gravitação. A superfície da Terra, a força da gravidade é três vezes superior à força correspondente na superfície de Marte, um marciano, portanto, pesaria três vezes mais na Terra, embora a sua força muscular fosse a mesma. O seu corpo pesar-lhe-ia tanto como uma capa de chumbo. Tal era, com efeito, a opinião corrente. Tanto The Times como o Daily Telegraph, por exemplo, insistiam neste ponto na manhã seguinte, e ambos esqueceram, como eu, duas óbvias influências que poderiam contrabalançá-lo.

A atmosfera da Terra, como já sabemos, contém muito mais oxigénio ou muito menos argónio (conforme o ponto de vista pelo qual se encare a questão) do que a atmosfera de Marte. As influências revigorantes deste excesso de oxigénio nos marcianos contribuem em muito, inegavelmente, para contrabalançar o aumento de peso dos seus corpos. E, em segundo lugar, ninguém considerou o facto de as inteligências tão mecânicas como as que os marcianos possuíam poderem perfeitamente prescindir do esforço muscular em caso de emergência.

Mas, nesse momento, não considerei estes pontos e, portanto, só encontrava obstáculos às possibilidades dos invasores. Com o vinho e a comida que ingerira, com a tranquilidade que sentia por estar sentado à minha mesa, a necessidade que tinha de serenar a minha mulher, ganhei coragem e segurança.

- Eles fizeram uma asneira - disse eu, palpando o copo de vinho. - São perigosos porque estão, sem dúvida, loucos de terror. Talvez não esperassem encontrar coisas vivas - certamente não esperavam encontrar coisas vivas inteligentes. Se acontecer o pior - prossegui -, uma bomba no fosso acabará com eles.

A intensa excitação provocada pelos acontecimentos deixara, certamente, os meus poderes de percepção num estado de eretismo. Lembro-me, ainda hoje, daquela mesa de jantar com uma clareza extraordinária. O querido rosto terno e ansioso da minha mulher, espiando-me sob o quebra-luz da lâmpada cor-de-rosa, a toalha branca com a louça, os copos e os talheres de prata - nesses dias até os escritores e filósofos tinham muitos pequenos luxos -, o vinho carmesim no copo, vejo tudo isto com uma nitidez fotográfica.

Sentei-me, por fim, fumando um cigarro, lamentando a imprudência de Ogilvy e ridicularizando o estúpido medo que as pessoas tinham dos marcianos.

Deve ter sido da mesma maneira que algum respeitável dronte, na ilha Maurícia, encarou e discutiu a chegada daquela nave de marinheiros implacáveis à procura de comida animal. “Acabamos com eles amanhã, meu caro.”

Não o sabia, mas aquele era o último jantar decente que devia comer durante muitos dias estranhos e terríveis.


VIII
NOITE DE SEXTA-FEIRA

Aquilo que mais me impressionou, de todas as coisas estranhas e fantásticas que sucederam nessa sexta-feira, foi a coexistência harmoniosa dos hábitos da nossa ordem social com os primeiros acontecimentos de uma série que faria, mais tarde, cair abruptamente essa mesma ordem. Se na noite de sexta-feira o leitor pegasse num compasso e desenhasse um círculo com um raio de oito quilómetros em redor dos fossos de areia de Woking, duvido que encontrasse fora dele qualquer ser humano - com excepção de Stent, dos três ou quatro ciclistas e das pessoas de Londres que jaziam mortas no baldio - cujas emoções e hábitos tivessem sido completamente afectados pelos viajantes do espaço. Na realidade, muitas pessoas tinham ouvido falar do cilindro e falaram acerca dele nos seus momentos de lazer, mas não causou decerto a sensação que um ultimato alemão teria provocado.

Nessa noite, em Londres, o telegrama do pobre Hendersòn, descrevendo o gradual desaparafusamento do projéctil, foi considerado uma peta; o jornal da tarde em que ele trabalhava, depois de lhe ter telegrafado, pedindo que o autenticasse - o homem estava morto -, decidira não publicar uma edição especial, pois não recebera resposta.

Mesmo no interior do círculo de oito quilómetros, a grande maioria das pessoas mostrava-se apática.

Já descrevi o comportamento dos homens e das mulheres com quem falei. Todas as pessoas do distrito estavam a jantar e a cear, os operários passeavam nos seus jardins depois do dia de trabalho, os jovens erravam pelas vielas, namorando, e os estudantes estavam agarrados aos livros.

Talvez houvesse um rumor nas ruas da cidade, um tópico novo e dominante nas cervejarias e, aqui e ali, um mensageiro, ou talvez alguma testemunha visual dos últimos acontecimentos, causava um redemoinho de excitação, exclamações, corridas de um lado para o outro; no entanto, na maior parte dos casos, a rotina diária - trabalhar, comer, beber e dormir - continuava igual ao que fora durante anos inumeráveis - como se não existisse o planeta Marte. Mesmo na estação de Woking, e em Horsell e Chobham, as coisas passavam-se desta maneira.

No entroncamento de Woking, até muito tarde, os comboios chegavam e partiam, outros eram manobrados para os desvios, os passageiros apeavam-se e esperavam e tudo decorria da maneira mais natural. Um rapaz, vindo da cidade, do monopólio Smith, vendia jornais com as notícias da tarde. O impacte retumbante dos vagões, o silvo penetrante das locomotivas, no entroncamento, misturavam-se com os seus gritos de “Homens de Marte!”. Alguns homens, excitados, entraram na estação, cerca das nove horas, com novidades incríveis; não causaram maior perturbação do que um grupo de bêbados. Algumas pessoas que se dirigiam de comboio para Londres perscrutavam a escuridão através das janelas e viam apenas um clarão bruxuleante, débil, dos lados de Horsell, um clarão vermelho e um delgado fio de fumo que subia para as estrelas; e pensaram que não estava a acontecer nada mais grave do que um incêndio no urzal. Só nas imediações do baldio era possível notar-se algum distúrbio. Havia uma dúzia de villas a arder na orla de Woking, luzes em todas as casas das três cidades perto do baldio, e as pessoas man-tiveram-se acordadas até de madrugada.

Uma curiosa multidão movia-se desassossegadamente; as pessoas iam e vinham, mas a multidão ficava, tanto na ponte de Chobham como na de Hor-sell. Soube-se mais tarde que um ou dois indivíduos audaciosos avançaram no escuro e aproximaram-se dos marcianos, mas que nunca mais voltaram. Um raio de luz, como o clarão de um farol, varria incessantemente o baldio e o Raio da Morte estava pronto a segui-lo. Com excepção destas pessoas, a grande área do baldio estava silenciosa e abandonada e os corpos carbonizados ficaram ali durante toda a noite, sob as estrelas, e durante todo o dia seguinte. Muitas pessoas ouviram o ruído de marteladas provindo do fosso.

Era este o estado de coisas na noite de sexta-feira. No centro, cravado na pele do velho planeta Terra como um dardo envenenado encontrava-se o cilindro. Mas o veneno ainda mal produzira efeito. Era redor, achava-se um trato de baldio silencioso, queimado em certos sítios, e na penumbra, indistintos, jaziam alguns objectos contorcidos. Aqui e ali via-se um arbusto ou uma árvore em chamas. Mais longe, havia uma certa excitação e, além, ainda não começara a perturbação. No resto do mundo, o curso da vida fluía como fluíra durante anos imemoriais. A febre da guerra, que deveria encher as veias e as artérias, aniquilar os nervos e destruir o cérebro, ainda não se propagara.

Durante a noite, os marcianos martelaram e agitaram-se, sem dormir, incansáveis, atarefando-se com as máquinas que estavam a aprontar, e uma coluna de fumo verde-claro elevava-se continuamente para as estrelas.

Cerca das onze, chegou a Horsell uma companhia de soldados que se espalhou em redor do baldio para formar um cordão. Mais tarde, uma segunda companhia atravessou Chobham para se desdobrar no lado norte do baldio. Alguns oficiais dos aquartelamentos de Inkerman estiveram ali de manhã cedo e um deles, o major Éden, foi dado como desaparecido. O coronel do regimento esteve na ponte de Chobham a fazer perguntas à multidão, à meia-noite. As autoridades militares preocupavam-se decerto com a gravidade da situação. Cerca das onze, os jornais da manhã afirmavam que um esquadrão de hussardos, dois Maxim e cerca de quatrocentos homens do regimento de Car-digan tinham partido de Aldershot.

Alguns segundos depois da meia-noite, a multidão que se encontrava na estrada de Chertsey-Woking viu uma estrela cair do céu sobre os pinhais, a noroeste. Tinha uma cor esverdeada e provocou um clarão com um brilho semelhante ao do Sol no pino do Verão. Este era o segundo cilindro.


IX
A BATALHA COMEÇA

O sábado vive na minha memória como um dia de suspense. Também foi um dia de lassidão, quente e abafado, e disseram-me que o barómetro oscilava rapidamente. Dormi pouco, embora a minha mulher tenha conseguido adormecer, e levantei-me cedo. Fui para o jardim antes do pequeno-almoço e pus-me à escuta, mas nada se movia para os lados do baldio, com excepção de uma cotovia.

O leiteiro chegou, como habitualmente. Ouvi o chiar da sua carroça e fui até ao portão para perguntar as últimas notícias. Contou-me que, durante a noite, os marcianos tinham sido cercados por tropas e que se esperavam armas. Em seguida - um som familiar, tranquilizante -, ouvi um comboio que se aproximava de Woking.

- Não serão mortos - disse o leiteiro -, se for possível evitá-lo.

Vi o meu vizinho a trabalhar no jardim, tagarelei com ele durante alguns momentos e depois voltei para dentro a fim de tomar o pequeno-almoço. Era uma manhã muito vulgar. O meu vizinho supunha que as tropas poderiam capturar ou destruir os marcianos durante o dia.

- É uma pena que tornem difícil a aproximação - disse ele. - Seria curioso saber como se vive noutro planeta; poderíamos aprender algumas coisas.

Aproximou-se da sebe e deu-me uma mão-cheia de morangos - era tão generoso quanto entusiástico. Ao mesmo tempo, informou-me acerca do incêndio ocorrido nos pinhais nas imediações de Byfleet Golf Links.

- Dizem - afirmou - que caiu outra dessas mal ditas coisas, o número dois. Mas uma chega, certa mente. Este grupo vai custar bastante dinheiro à segurança das pessoas antes de estar tudo arrumado.

- Riu, com um ar do mais natural bom-humor, ao dizer isto. - Os bosques - continuou - ainda estão em chamas. - Apontou para o fumo. - Hão-de queimar-nos os pés durante alguns dias por causa da espessa camada de agulhas de pinheiro e de turfa. -Em seguida, falou, com uma expressão grave, do “pobre Ogilvy”.

Depois de tomar o pequeno-almoço, em vez de trabalhar decidi dar um passeio até ao baldio. Debaixo da ponte da via férrea encontrei um grupo de soldados - penso que eram sapadores, homens com pequenos quépis redondos, jaquetas vermelhas, sujas e desabotoadas, debaixo das quais se viam blusas azuis, calças escuras e botas que chegavam até à barriga das pernas. Disseram-me que ninguém estava autorizado a atravessar o canal e, ao fixar a estrada para os lados da ponte, vi um dos homens de Cardigan de sentinela. Conversei com estes soldados durante alguns momentos; contei-lhes que vira os marcianos na tarde anterior. Nenhum deles os notara e, como só tinham ideias vagas acerca da sua conformação, importunaram-me, portanto, com perguntas. Disseram que não sabiam quem tinha autorizado os movimentos das tropas; pensavam que houvera discussão nos Horse Guards.

O sapador vulgar é muito mais instruído do que um soldado. Discutiram, com certa agudeza, as condições peculiares da possível luta. Descrevi-lhes o Raio da Morte e começaram a discutir entre si.

Devemos avançar sob cobertura e atacá-los bruscamente- dizia um.

Logo vi! - disse outro. - De que é que serve uma cobertura contra esse calor? Paus para a fogueira que nos poderá assar! O que temos a fazer é avançar o mais que o solo nos permitir e então cavar uma trincheira.

Vai para o diabo com as tuas trincheiras! Só pensas em trincheiras. Deves ser filho de um coelho, Snippy.

Eles não têm pescoço? - perguntou um terceiro, abruptamente. Era um homem baixo e trigueiro, contemplativo, que fumava cachimbo.

Repeti a minha descrição.

Octópodes - disse ele -, é o que eu lhes chamo. Trata-se de pescadores de homens... Chegou a altura de combater contra peixes!

Não há animais mais ferozes do que esses - tornou o primeiro que falara.

Porque é que não bombardeiam essas malditas coisas e acabam com elas? - perguntou o homem trigueiro.

Onde estão as tuas bombas? - exclamou de novo o primeiro. - Não há tempo para isso. Acho é que devemos atacar de surpresa e já.

Continuaram a discutir neste tom. Abandonei-os passados momentos e continuei o meu caminho até à estação dos caminhos de ferro, onde ia comprar os jornais da manhã que houvesse.

Mas não vou maçar o leitor com uma descrição dessa longa manhã e dessa longa tarde. Não consegui deitar um olhar ao baldio, pois mesmo as torres das igrejas de Horsell e Chobham estavam sob controle das autoridades militares. Os soldados que interpelei não sabiam de nada; os oficiais mostravam-se enigmáticos e atarefados. Encontrei algumas pessoas na cidade, tranquilizadas graças à presença dos militares, e soube em primeira mão, por intermédio de Marshall, o armazenista de tabacos, que o filho se encontrava entre os mortos no baldio. Os soldados tinham obrigado as pessoas nos arrabaldes de Horsell a fechar as portas e a abandonar as suas casas.

Cerca das duas horas, voltei a casa para almoçar, muito cansado, pois, como já disse, o dia estava extremamente quente e abafado; de tarde, a fim de refrescar, tomei um banho frio. Cerca das quatro e meia dirigi-me à estação para comprar um jornal da tarde, pois os jornais da manhã continham apenas uma descrição muito incompleta da morte de Stent, de Ogilvy e dos outros. Porém, li poucas coisas que desconhecesse. Os marcianos não tinham mostrado uma polegada de si mesmos. Pareciam atarefados no fosso, ouvia-se martelar e via-se uma serpentina quase contínua de fumo. Aparentemente, ocupavam-se dos preparativos da batalha. “Fizeram-se há pouco tentativas para comunicar com eles, mas sem êxito.” Era esta a fórmula estereotipada dos jornais. Um sapador contou-me que estas tentativas tinham sido levadas a cabo por um homem, entrincheirado com uma bandeira espetada numa vara comprida. Os marcianos importaram-se tanto com estas manifestações amistosas como nós nos teríamos importado com o mugido de uma vaca.

Devo confessar que me entusiasmei bastante ao ver todo este armamento, ao notar todos estes preparativos. A minha imaginação, sobreexcitada, desafiou os invasores de uma dúzia de maneiras. Reviveu fragmentos dos meus sonhos de estudante, de batalhas e de heroísmos. Nesse momento, nem me parecia tratar-se de um combate justo. Os marcianos dir-se-iam indefesos no seu fosso.

Cerca das três horas, começou a ouvir-se, a intervalos regulares, o disparo de uma peça, situada em Chertsey ou Addlestone. Informaram-me de que o pinhal no qual caíra o segundo cilindro estava a ser bombardeado, na esperança de se destruir aquele objecto antes de ele ser aberto. Foi só cerca das cinco que chegou a Chobham uma peça de campanha para utilizar contra o primeiro grupo de marcianos.

Perto das seis horas da tarde, quando me achava a tomar chá com a minha mulher no pavilhão do jardim, conversando animadamente acerca da batalha, ouvi uma detonação abafada provinda do baldio e, logo a seguir, uma rajada. Quase simultaneamente ouviu-se um estampido violento, muito próximo, o qual fez estremecer o solo; e, sobre o relvado, as copas das árvores que bordam o Oriental College começaram bruscamente a arder com uma chama vermelha e fumegante, e a torre da pequena igreja vizinha desabou, feita em pedaços. O pináculo da mesquita sumira-se e o telhado do colégio parecia ter sido alvejado por uma arma de cem toneladas. Uma das nossas chaminés ruiu como se tivesse sido atingida por um projéctil, e um dos fragmentos caiu despedaçando as telhas; destroços vermelhos cobriram o canteiro de flores ao pé da janela do meu escritório.

Eu e a minha mulher ficámos assombrados. Compreendi que a crista de Maybury Hill devia estar ao alcance do Raio da Morte, pois o colégio desaparecera.

Quando compreendi este facto, agarrei no braço da minha mulher e empurrei-a sem cerimónia para a estrada. Em seguida, fiz sair a criada, dizendo que eu mesmo subiria as escadas para ir buscar a caixa que ela reclamava.

-É provável que não possamos ficar aqui - disse eu, e, ao dizer isto, o tiroteio recomeçou durante alguns momentos no baldio.

- Mas para onde vamos? - perguntou a minha mulher, aterrorizada.

Reflecti, perplexo. Lembrei-me, depois, dos seus primos de Leatherhead.

- Leatherhead! - gritei, mais alto que o ruído que se produzira subitamente.

Ela fitou a colina. As pessoas saíam de casa, atónitas.

- Como poderemos chegar a Leatherhead? - perguntou.

Avistei, no sopé da colina, um pequeno grupo de hussardos a cavalo, debaixo da ponte da via férrea; três deles atravessaram a galope os portões, abertos, do Oriental College. Os outros dois desmontaram e começaram a correr de casa em casa. O Sol, cujos raios se filtravam através do fumo que se erguia das copas das árvores, parecia de vermelho-sangue.

- Deixa-te ficar aqui - disse eu. - Aqui estás a salvo.

Parti imediatamente em direcção ao Spotted Dog, pois sabia que o proprietário desta estalagem tinha um cavalo e um cabriole. Corri, pois apercebia-me de que em breve se verificaria uma debandada geral deste lado da colina.

Encontrei-o no bar. Desconhecia inteiramente o que se estava a passar atrás de sua casa. Um homem, de costas para mim, conversava com ele.

Ofereci-lhe duas libras pelo aluguer do cabriole. Disse-lhe que estaria de volta, com o veículo e o animal, cerca da meia-noite.

- Duas libras e devolve-mo? Que é que se passa? - perguntou o proprietário.

Expliquei-lhe apressadamente que tinha de sair de casa e, portanto, precisava de utilizar o cabriole. Nesse momento, não me parecia que ele tivesse a mesma urgência em abandonar a sua casa. Levei o cabriole e desci a estrada; e, deixando-o a cargo da minha mulher, fui a casa e embrulhei alguns objectos de valor, toda a baixela que possuíamos, etc. As faias nas imediações da casa ardiam, assim como as paliçadas que davam para a estrada. Entretanto, um dos hussardos que desmontara aproximou-se a correr. Andava de casa em casa, avisando as pessoas para que as abandonassem. Preparava-se para partir quando saí pela porta da frente, com os tesouros embrulhados numa toalha de mesa.

Gritei-lhe:

- Que novidades há?

Ele voltou-se, fitou-me, murmurou qualquer coisa acerca de “saírem numa coisa parecida com uma tampa de metal” e correu para o portão da casa no topo da colina. Uma súbita nuvem de fumo negro, na estrada, ocultou-o durante alguns momentos. Corri para a porta do meu vizinho e comprovei que tinha partido para Londres com a mulher e haviam fechado a porta à chave. Entrei de novo em casa para cumprir a minha promessa de trazer a caixa da criada, coloquei-a na retaguarda do cabriole e pulei para o assento do cocheiro, ao lado de minha mulher. No momento seguinte, estávamos livres do fumo e do ruído e voávamos, descendo o declive oposto de May-bury Hill, em direcção a Old Woking.

Encontrámo-nos perante uma paisagem calma e soalheira, uma seara de trigo do outro lado da estrada e a estalagem de Maybury com o seu letreiro colorido. Avistei a carroça do médico à nossa frente. No sopé da colina, virei a cabeça para lançar um olhar à colina que abandonávamos. Espessas colunas de fumo negro, entrelaçadas com fios de chamas, erguiam-se no ar calmo e projectavam sombras negras sobre as copas verdes das árvores, a leste. O fumo estendera-se já de leste a oeste - para leste até aos pinhais de Byfleet e para oeste até Woking. A estrada estava semeada de gente que corria na direcção que seguíamos. E, muito fraco mas distinto, através do ar quente e calmo, ouvimos o zumbido de uma metralhadora, em breve emudecida, e o ruído intermitente da descarga de espingardas. Aparentemente, os marcianos incendiavam tudo o que se encontrava ao alcance do Raio da Morte.

Não sou um condutor experimentado; tive de voltar de novo a minha atenção para o cavalo. Quando tornei a olhar para trás, a segunda colina já ocultara o fumo negro. Açoitei o cavalo com o chicote e dei-lhe rédeas até que Woking e Send se interpuseram entre nós e o tumulto de agitação. Alcancei e ultrapassei o médico, entre Woking e Send.


X SOB A TEMPESTADE

Leatherhead encontra-se a cerca de vinte quilómetros de distância de Maybury Hill. O aroma do feno pairava sobre os prados viçosos das imediações de Pyrford, e multidões de rosas bravas davam frescura e alegria às sebes que bordavam a estrada. O tiroteio pesado que se ouvira enquanto descíamos Maybury Hill cessara tão abruptamente como tinha começado, restituindo à tarde a sua placidez. Chegámos a Leatherhead sem incidentes, cerca das nove horas. Dei uma hora de descanso ao cavalo enquanto ceava com os meus primos e recomendava a minha mulher que tivesse cuidado.

A minha mulher manteve-se estranhamente silenciosa durante a viagem e parecia deprimida por maus presságios. Tentei serená-la, salientando que os marcianos estavam amarrados ao fosso pelo seu peso e, quando muito, poderiam percorrer uma pequena distância; no entanto, ela limitou-se a responder-me por monossílabos. Se não fosse a promessa que eu fizera ao estalajadeiro, estou certo de que ela teria instado comigo a ficar nessa noite em Leatherhead. Oxalá tivesse ficado! Lembra-me de que o seu rosto estava muito pálido quando parti.

Por meu lado, estivera febrilmente excitado durante todo o dia. Alguma coisa muito semelhante à febre da guerra que se propaga ocasionalmente numa comunidade civilizada instilara-se-me no sangue e no coração. Não lamentava muito ter de regressar a Maybury nessa noite. Receava mesmo que a última fuzilaria que ouvira significasse o extermínio dos invasores marcianos. Só posso exprimir o meu estado de espírito dizendo que queria estar presente quando morressem.
Eram cerca das onze horas quando iniciei a viagem de regresso. A noite estava inesperadamente sombria; depois de atravessar o corredor iluminado da casa dos meus primos, parecia realmente negra e estava tão quente e abafada como o dia. As nuvens deslocavam-se rapidamente, embora nem um sopro de vento agitasse os arbustos que nos cercavam. O criado do meu primo acendeu ambas as luzes do cabriole. Felizmente, eu conhecia bem a estrada. A minha mulher ficou sob a luz da porta de entrada e observou-me enquanto eu tomava lugar no veículo. Em seguida, voltou-se bruscamente e entrou, enquanto os meus primos me desejavam boa viagem.

A princípio, senti-me um pouco deprimido, contagiado pelos receios da minha mulher, mas em breve os meus (pensamentos se orientaram para os marcianos. Nesse momento, desconhecia inteiramente o decurso do combate da tarde. Nem sequer conhecia as circunstâncias que tinham precipitado o conflito. Quando atravessei Ockham (pois foi este o caminho que tomei, em vez de Send e Old Woking) avistei a oeste, na linha do horizonte, um clarão vermelho-sangue que se elevava lentamente à medida que me aproximava.

As nuvens da trovoada que ameaçava explodir entremeavam-se ali com massas de fumo negro e vermelho.

Ripley Street estava deserta e, com excepção de uma ou outra janela iluminada, a vila não mostrava nenhuns sinais de vida; mas dificilmente evitei um acidente na curva da estrada, onde se encontrava um grupo de pessoas de costas voltadas para mim. Não me disseram nada quando passei. Desconheço o que sabiam acerca do que acontecera na colina, nem se as casas silenciosas por que passava dormiam tranquilamente, ou se se achavam abandonadas e vazias, ou se os seus moradores perscrutavam, aterrorizados e vigilantes, o terror da noite.

Desde Ripley até Pyrford, atravessei o vale de Wey e perdi de vista o clarão vermelho. Ao subir a pequena colina perto da igreja de Pyrford, descobri-o de novo; as árvores que me cercavam estremeciam sob as primeiras ameaças da tempestade que se aproximava. Ouvi bater a meia-noite na igreja de Pyrford, Em seguida, vi a silhueta de Maybury Hill, com as copas das árvores e os telhados desenhando-se, negros, no fundo vermelho.

Precisamente no momento em que observava isto, um clarão verde-claro iluminou a estrada e mostrou os distantes bosques para os lados de Addlestone. Senti um puxão nos rins. As nuvens pareciam ter sido trespassadas por um fio de chamas verdes, que iluminara de súbito a sua massa confusa e caíra no campo, à minha esquerda. Era a terceira estrela cadente!

Imediatamente a seguir à sua aparição, de um violeta ofuscante por contraste, luziu o primeiro relâmpago da trovoada e o trovão ribombou por cima da minha cabeça como um foguete. O cavalo tomou o freio nos dentes e disparou.

Descemos o declive suave que parte do sopé de Maybury Hill. Mal começou a relampejar, os relâmpagos seguiram-se numa sucessão tão rápida como jamais vira. Os trovões, logo a seguir uns aos outros e com um estranho acompanhamento de estrondos, atroavam mais como o trabalho de uma gigantesca máquina eléctrica do que como as habituais reverberações detonantes da trovoada. A luz fulgurante ofuscava e perturbava a vista, e um granizo miúdo gol-peou-me violentamente o rosto quando descia a ladeira.

De início, pouco mais via do que a estrada diante de mim, e, depois, a minha atenção foi despertada bruscamente por alguma coisa que descia rapidamente pelo declive oposto de Maybury Hill. A princípio pensei tratar-se do telhado molhado de uma casa, mas um relâmpago e logo outro mostraram que se achava em rápido movimento de rotação. Era uma visão ilusória-um momento de escuridão desconcertante, e a seguir, sob um relâmpago tão intenso como a luz do dia, as massas vermelhas do Orfanato, próximo do topo da colina, as copas verdes dos pinheiros e aquele objecto discutível, apareceram nítidos, distintos e brilhantes.

E a Coisa que eu vi! Como poderei descrevê-la? Um trípode monstruoso, maior do que muitas casas, passando por cima dos jovens pinheiros, esmagan-do-os ao passo que caminhava; um engenho móvel de metal luzente, caminhando agora através do urzal; pendiam dele cabos articulados de aço e o estrépito produzido pela sua passagem misturava-se com o ribombar do trovão. Viu-se nitidamente sob um relâmpago, com dois pés no ar, e desaparecer e reaparecer quase instantaneamente, quando relampejou de novo, uns cem metros mais perto. Podeis imaginar um banco de ordenhar, balançando e rolando com violência ao longo do solo? Foi esta a impressão que os relâmpagos deram nesse momento. Mas em vez de um banco de ordenhar, imagine-se um grande corpo mecânico sobre uma plataforma trípode.

Em seguida, as árvores do pinhal defronte de mim apartaram-se, tal como os frágeis juncos são separados por um homem que abre caminho através deles; foram quebrados e empurrados bruscamente, e surgiu um outro trípode enorme, arremetendo, ao que parecia, na minha direcção. Eu galopava velozmente ao seu encontro! Ao ver o segundo monstro, o meu sangue-frio abandonou-me completamente. Sem parar para fitá-lo de novo, torci com violência a cabeça do cavalo para a direita e, no momento seguinte, o cabriole saltou por cima do cavalo, os varais partiram-se ruidosamente e eu fui atirado para o lado, caindo pesadamente num charco de água pouco profundo.

Saltei para fora quase imediatamente e agachei-me, com os pés ainda dentro de água, debaixo de uma moita de tojo. O cavalo jazia imóvel (partira o pescoço, o pobre animal!), e, à luz dos relâmpagos, vi a massa escura do cabriole virado e a silhueta da roda que continuava a girar lentamente. Nesse mesmo instante o mecanismo passou perto de mim e subiu a colina em direcção a Pyrford.

Visto de perto, o objecto era incrivelmente estranho, pois não se tratava de uma simples máquina insensível seguindo o seu caminho. Era, na realidade, uma máquina cujo passo metálico ressoava e tinha tentáculos compridos, flexíveis e reluzentes (um deles agarrou um jovem pinheiro) que balouçavam e chocalhavam em redor do seu estranho corpo. Escolhia cuidadosamente o seu caminho e o capuz de latão que a sobrepujava movia-se de um lado para o outro, sugerindo uma cabeça a olhar em redor. Atrás da parte principal do corpo achava-se uma massa enorme de metal branco, semelhante a um cesto de pescador, gigantesco; baforadas de fumo verde esguichavam das juntas dos membros quando o monstro passou ao pé de mim. Desapareceu instantaneamente.

E foi esta a visão que tive dele, vagamente, iluminado pela luz fulgurante dos relâmpagos, intervalada por densas sombras negras.

Quando passou, soltou um berro entusiástico e atroador que abafou o trovão - Aloo! Aloo!-e, um minuto depois, alcançou o companheiro que se achava cerca de um quilómetro de distância, curvado sobre alguma coisa que ali se encontrava. Não tinha dúvida nenhuma de que essa coisa era o terceiro dos dez cilindros com que nos tinham alvejado de Marte.

Permaneci ali durante alguns minutos, à chuva e às escuras, observando, por sobre o topo das sebes e à luz intermitente dos relâmpagos, estes monstruosos seres de metal que se moviam a uma certa distância. Começara a tombar um granizo miúdo e as figuras deles tornavam-se mais indistintas e relampejavam de novo sob os relâmpagos. De vez em quando havia um intervalo em que não relampejava e a noite engolia-os.

Eu estava ensopado de granizo por cima e pela água enlameada, em baixo. Se fosse alguns momentos antes, o espanto faria com que me arrastasse pela ladeira à procura de uma posição mais enxuta, ou pensasse unicamente acerca do iminente perigo que corria.

Não muito longe, no bosque, avistei uma pequena cabana de colono, de um só compartimento, bordada por um terreno cultivado por tomatais. Pus-me de pé, por fim, e, agachado e utilizando todas as possibilidades de cobertura, corri na sua direcção. Bati à porta, mas não consegui que me ouvissem (se é que havia alguém no interior) e desisti passados alguns momentos. Aproveitando uma vala durante a maior parte do caminho, consegui chegar, sem ser notado por estas máquinas monstruosas, ao pinhal nas imediações de Maybury.

Prossegui a coberto do pinhal, molhado e a tremer de frio, a caminho de casa. Caminhei entre as árvores, tentando encontrar a vereda. Na verdade, fazia muito escuro no bosque, pois os relâmpagos eram agora menos frequentes e o granizo caía torrencialmente, em grossas cordas, entre as aberturas da folhagem densa.

Se tivesse compreendido inteiramente o significado de todas as coisas que vira, teria feito um desvio, encaminhando-me de Byfleet para Chobham e, assim, ter-me-ia juntado a minha mulher em Leather-head. Mas, nessa noite, a estranheza das coisas que me envolviam e as minhas más condições físicas impediram-mo, pois estava contundido, cansado, molhado até aos ossos, ensurdecido e cego pela tempestade.

Tinha uma vaga ideia de continuar o meu caminho para casa e esse era o meu único objectivo. Cambaleava através das árvores, caí numa vala e esfolei os joelhos numa tábua e, finalmente, patinhei na ladeira a seguir ao College Arms. Disse que patinhei, pois a água da chuva estava a arrastar a areia da colina numa torrente enlameada. Na escuridão, um homem chocou comigo e fez-me cambalear. Soltou um grito de terror, saltou para o lado e acelerou o passo antes que eu me recompusesse o bastante para lhe dirigir a palavra. A violência da tempestade era tal, neste sítio, que se me tornou muito difícil subir a colina. Passei rente a uma cerca, à esquerda, e continuei ao longo das suas paliçadas.

Perto do topo, tropecei em qualquer coisa macia e, à luz de um relâmpago, vi, entre os meus pés, um monte de fino tecido negro e um par de botas. Antes que pudesse distinguir claramente em que estado o homem se achava, a luz desvaneceu-se. Permaneci ao pé dele, aguardando outro relâmpago. Quando este se verificou, vi que se tratava de um homem robusto, envergando roupas baratas mas não miseráveis, com a cabeça debaixo do corpo. Jazia, amassado, rente à cerca, como se tivesse sido projectado com violência contra ela.

Vencendo a repugnância natural de quem nunca tocou num cadáver, curvei-me e voltei-o para palpar-lhe o coração. Estava morto. Aparentemente, partira o pescoço. Relampejou de novo e o seu rosto foi iluminado. Era o proprietário do Spotted Dog, cujo veículo pedira emprestado.

Passei cuidadosamente por cima dele e continuei a subir a colina. Passei pelo posto da polícia e pelo College Arms, em direcção à minha casa. Não vi nada a arder no declive, embora chegasse ainda, do baldio, um clarão vermelho e um tumulto de fumo em remoinho, avermelhado, batido pelo granizo. Tanto quanto os relâmpagos me permitiam ver, a maioria das casas das imediações não estava danificada. Próximo do College Arms jazia, no solo, um vulto escuro.

Enquanto descia a estrada na direcção da ponte de Maybury, ouvia vozes e o ruído de passos, mas não tive coragem de gritar ou de me aproximar.

Entrei em casa, utilizando a chave de trinco, cerrei a porta, fechei-a à chave e tranquei-a. Cambaleei ao pé da escada e sentei-me. A minha imaginação estava povoada por aqueles monstros metálicos e pelo cadáver esmagado contra a cerca.

Agachei-me ao fundo das escadas, encostado à parede, tremendo com violência.





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