CONTO ESTRANHO
De Luciano Barreto
O homem falava em voz baixa, cansada.
— Deus do céu. Estou amofinado neste quarto não sei por quanto tempo. Acho que vou ficar maluco. Um cheiro horrível, fezes e urina misturadas a suor e mofo, exala dessa escuridão que estou. Já medi o cubículo. Sem intenção, mas já. Não caibo deitado nele. Ou inclino meu dorso ou levanto minhas pernas e coloco-as na parede. Ínfimo, o tamanho. Mas ainda estou vivo. Sei que posso sair dessa. Caso tenha sorte consigo sair dessa. A fome apossou-se de mim há algum tempo. Ando comendo o reboco da parede. Ele já está caindo mesmo. Então é só encostar a mão e pegar os pedaços do chão úmido. Não é lá dos piores. Tive um cachorro que comia os rebocos do canil. Contudo eu sempre lhe servia a ração no horário o qual podia. Para matar minha sede, urino na mão – de pouco a pouco – e bebo. Não consigo sequer falar direito. Quando me enfurnaram aqui – não lembro como aconteceu – eu já estava fraco demais para gritar.
— Ei. Está me ouvindo?
“Seria alucinação ou estou ouvindo uma voz?” – pensou o homem jogado dentro daquela escuridão.
— Oi. – ele falou fracamente.
— Você morreu de quê? – perguntou uma voz vigorosa.
— Morri? Estou quase morrendo. Mas ainda estou vivo.
— Deixe de ser palhaço, cara. Eu morri transando com uma prostituta. Tomei um comprimido que era um poderoso vaso-dilatador e meu coração não agüentou. Acho que minha esposa ficou decepcionada. Você está aqui há quanto tempo?
— Não sei.
— Eu peguei a pena de três vidas. Daqui para frente, por três vezes quando nascer já o farei morto. Fiquei sabendo que é horrível, mas pelo menos tenho comida e bebida aqui na minha cela. Que você fazia antes de morrer?
— Rapaz... não estou morto. Mas eu – antes de estar aqui – era vendedor. Vendia remédios. Nunca fiz mal a ninguém!
— Puxa... deve ter alguma coisa aí que você não está se lembrando. Porque... creio que a comida e a bebida irão demorar a chegar a você. Estou saboreando um guisado de frango. Tive informações sobre você.
— Meu Deus do céu... – gritou o homem. — Não fala isso cara. Eu preciso comer e beber algo urgente. Eu matei um homem uma vez... era o amante de minha mulher.
— Agora sim. – falou o outro lentamente. — Mas tenha calma. Relaxe. Tenho duas notícias para você. Uma boa e outra ruim. Qual você quer escutar primeiro?
— Manda a boa, primeiro.
— Você já morreu. Acredite em mim. Todos, que aqui estão, já morreram.
— Talvez seja verdade. E a ruim?
— Você vai ficar sofrendo de fome e sede por toda a eternidade. Para os que matam, a pena é essa. Sinto muito.
O homem – encerrado na masmorra - arregalou os olhos de horror, vincou os lábios ressequidos e berrou agitado, usando as últimas forças.
— Não. Não. Não. Seu mentiroso. Dê-me um frango assado e uma jarra de suco de laranja. Dê-me! Dê-me!
O homem falava em voz baixa, cansada.
— Deus do céu. Estou amofinado neste quarto não sei por quanto tempo. Acho que vou ficar maluco. Um cheiro horrível, fezes e urina misturadas a suor e mofo, exala dessa escuridão que estou. Já medi o cubículo. Sem intenção, mas já. Não caibo deitado nele. Ou inclino meu dorso ou levanto minhas pernas e coloco-as na parede. Ínfimo, o tamanho. Mas ainda estou vivo. Sei que posso sair dessa. Caso tenha sorte consigo sair dessa. A fome apossou-se de mim há algum tempo. Ando comendo o reboco da parede. Ele já está caindo mesmo. Então é só encostar a mão e pegar os pedaços do chão úmido. Não é lá dos piores. Tive um cachorro que comia os rebocos do canil. Contudo eu sempre lhe servia a ração no horário o qual podia. Para matar minha sede, urino na mão – de pouco a pouco – e bebo. Não consigo sequer falar direito. Quando me enfurnaram aqui – não lembro como aconteceu – eu já estava fraco demais para gritar.
— Ei. Está me ouvindo?
“Seria alucinação ou estou ouvindo uma voz?” – pensou o homem jogado dentro daquela escuridão.
— Oi. – ele falou fracamente.
— Você morreu de quê? – perguntou uma voz vigorosa.
— Morri? Estou quase morrendo. Mas ainda estou vivo.
— Deixe de ser palhaço, cara. Eu morri transando com uma prostituta. Tomei um comprimido que era um poderoso vaso-dilatador e meu coração não agüentou. Acho que minha esposa ficou decepcionada. Você está aqui há quanto tempo?
— Não sei.
— Eu peguei a pena de três vidas. Daqui para frente, por três vezes quando nascer já o farei morto. Fiquei sabendo que é horrível, mas pelo menos tenho comida e bebida aqui na minha cela. Que você fazia antes de morrer?
— Rapaz... não estou morto. Mas eu – antes de estar aqui – era vendedor. Vendia remédios. Nunca fiz mal a ninguém!
— Puxa... deve ter alguma coisa aí que você não está se lembrando. Porque... creio que a comida e a bebida irão demorar a chegar a você. Estou saboreando um guisado de frango. Tive informações sobre você.
— Meu Deus do céu... – gritou o homem. — Não fala isso cara. Eu preciso comer e beber algo urgente. Eu matei um homem uma vez... era o amante de minha mulher.
— Agora sim. – falou o outro lentamente. — Mas tenha calma. Relaxe. Tenho duas notícias para você. Uma boa e outra ruim. Qual você quer escutar primeiro?
— Manda a boa, primeiro.
— Você já morreu. Acredite em mim. Todos, que aqui estão, já morreram.
— Talvez seja verdade. E a ruim?
— Você vai ficar sofrendo de fome e sede por toda a eternidade. Para os que matam, a pena é essa. Sinto muito.
O homem – encerrado na masmorra - arregalou os olhos de horror, vincou os lábios ressequidos e berrou agitado, usando as últimas forças.
— Não. Não. Não. Seu mentiroso. Dê-me um frango assado e uma jarra de suco de laranja. Dê-me! Dê-me!
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