7.6.07

O REFLEXO PERDIDO

Em sua homenagem aos mestres clássicos a Câmara traz, desta vez, o grande gênio alemão E. T. A. Hoffman. Especialista em narrativas complexas e sombrias. Um presente para nossos amigos e irmãos das sombras. Boa leitura!

O REFLEXO PERDIDO

E.T.A HOFFMAN



I
Uma tarde de inverno, à espera do último dia do ano, senti de repente o sangue queimar-me nas veias e o coração gelar-me no peito. Lá fora, rajadas de tempestade agitavam a noite. Esta crise do céu transmitia-me descargas elétricas ao corpo; meu cérebro fervia como metal em fusão. Quando todos os meus nervos ficaram saturados desse fluido desconhecido, a que se dá o nome de febre ou delírio, não pude mais ficar em casa e corri para fora, sem manto, os cabelos ao vento. Os cata-ventos das casas guinchavam como gatos enfurecidos e parecia-me distinguir, entre as vozes confusas da tempestade, o tiquetaquear do relógio que assinala a queda das horas no abismo da eternidade.


Coisa bizarra! A véspera de Ano Novo que é, para toda gente, uma data alegre, encontrava-me presa de fundas dores morais. Seria porque, a cada festa de Natal, contando os dias que haviam decorrido e sentindo-me envelhecer, eu entrevisse mais de perto a aproximação do fim? Pressentia-o apenas e não podia evitar que um terror misterioso de mim se apoderasse; tanto mais quanto o diabo sempre teve o cuidado de reservar-me, para o São Silvestre, qualquer nova desventura.


Ontem, por exemplo, ao entrar num salão, deparei, sentada em companhia de um grupo de damas, com uma figura de feições angelicais... Sim, era Ela! Ela, a quem eu não via há cinco anos!...


"Deus seja bendito", exclamei no fundo da alma; "Ela voltou para mim". Fiquei interdito, como se a varinha de um mágico me houvesse tocado. Nesse instante, o dono da casa tocou-me levemente o ombro:


- Então, caríssimo Hoffmann – disse-me ele – em que pensas?


Voltei a mim, muito envergonhado de minha inépcia, e aproximeime da mesa de chá para sair do embaraço.


Nesse momento, Ela me viu, levantou-se e veio dizer-me, num tom de voz cheio de indiferença:



- Tu aqui? Encantada de ver-te. Como tens passado?


Depois, sem esperar resposta, sentou-se novamente, dirigindo à sua vizinha estas palavras, que me trespassaram o coração.


- Teremos, então, na semana que vem, um belo concerto no palácio?


Um raio, caindo a meus pés, não me teria perturbado tanto.


Figurai-vos que experimentaria um homem que, ao aproximar-se de uma rosa cultivada com amor, para respirar-lhe o perfume, sentisse uma vespa sair do cálice da flor e picar-lhe o nariz. Recuei de modo tão brusco, os olhos turvados pelo sangue que me subira à cabeça, que derrubei ao chão uma travessa de sorvetes. Rolou tudo sobre o tapete; nesse instante, desejaria estar enterrado a cem toesas de profundidade. Por sorte, um artista célebre acaba de entrar. Fui esquecido e pude contemplar Ela, Júlia, em todo o esplendor de sua beleza.


Pareceu-me mais alta, mais cheia de formas, mais sedutora do que nunca. Suas vestes, de imaculada brancura, ondeavam, em pregas, sobre seu corpo. Suas espáduas e seu pescoço se destacavam, como um bloco de neve, contra o decote enfeitado de rendas; seus cabelos de um negro de ébano, desatavam-se em cachos cambiantes, que lhe davam à face um caráter seráfico. Ao passar perto de mim, voltou-se e acreditei ter lido, no seu olhar de um azul tão doce, não sei que expressão zombeteira.


Minha razão sumiria se o maestro, que acabara de iniciar uma cantata, não me houvesse refrescado a alma com uma cascata de harmonias. Apenas terminou a execução, o auditório cumulou-o de felicitações. Mas, nesse turbilhão de diletantes, vi-me separado de Júlia por alguns instantes. Reencontramo-nos pouco depois, diante de uma poncheira. Então, ó ventura inaudita! ela ofereceu-me um copo, sorrindo celestialmente e dizendo-me, com uma voz cuja lembrança
nada poderá jamais apagar de minha memória:


- Quer aceitá-lo de minhas mãos, como antigamente?


Ao recebê-lo, rocei-lhe os dedos; mil faíscas abrasaram-me o sangue. Bebi o licor dourado até a última gota e pareceu-me que chamas azuladas voavam sobre meus lábios. Meus sentidos nadavam numa embriaguez deliciosa e quando voltei a mim, estávamos, eu e Ela, lado a lado, sobre os coxins de um divã rosa, ao fundo de um gabinete iluminado pela luz sonhadora de uma lâmpada de alabastro, suspensa por cadeias de prata.


Júlia a meu lado, Julia sorridente, afetuosa como outrora; não seria tudo um sonho? Ai! Sonho ou realidade, a ele me entregava inteiramente. Parecia-me ouvi-la dizer as palavras mágicas:


- Meu Teodoro, amo-te, não vivo senão por ti. És a minha poesia e a minha felicidade!


E eu lhe respondia:


- Deus nos reuniu e nem todas as potências do inferno poderão nos separar!


Subitamente um pequeno manequim, com olhos de rã, sustentado por patas de aranha, apareceu tropeçando no meio do gabinete.


- Onde, com todos os diabos, te meteste, Júlia? – disse, esticando um nariz pintalgado de tabaco de Espanha.


Júlia levantou-se e despertou-me atrozmente com estas palavras:


- Então, não achas que devemos voltar à festa? Como vês, meu marido está à minha procura. És bem divertido, tanto quanto outrora, meu caro Teodoro; entretanto, não deves beber tanto ponche.


Soltei um grito de desespero.


- Perdida para toda a eternidade!!!


- É como diz, meu bravo senhor – respondeu o odioso animal, a quem ela chamava seu marido.


Era demais para as minhas forças. Sentia-me enlouquecer. Num átimo, vi-me fora do salão, correndo pela escada abaixo. Na rua, a chuva que tombava em cascatas molhava-me o rosto. Eu corria desabaladamente, sem direção nem consciência. E teria continuado a correr se a taverna de mestre Thiermann não me detivesse a fuga com suas portas abertas. Por elas adentro me precipitei, a respiração ofegante, a goela seca e os olhos dilatados.


Julgaram-me bêbado; não há freguês melhor que um bêbado. Dessarte, malgrado a falta de chapéu e casaco, o hospedeiro, ao me ver elegantemente trajado, perguntou-me polidamente que desejava eu.


- Um canecão de cerveja e um cachimbo!


Fui servido imediatamente.


Os freqüentadores da taverna me olhavam pelo canto dos olhos e o hospedeiro ia talvez me interrogar sobre a aventura, que a minha visita, em semelhante desalinho, fazia suspeitar, quando três batidas nas vidraças da taverna seguidas de um grito: "Abra depressa, sou eu!", desviou-lhe a atenção. Ele acorreu à porta, com um castiçal, e logo depois um homem alto, descarnado como um esqueleto, entrou na sala e encaminhou-se, andando de lado, com as costas voltadas para a parede, para uma pequena mesa, onde se sentou. Esta personagem tinha aparência distinta, mas pensativa. Pediu, como eu, cerveja e tabaco; encheu o cachimbo com impaciência e envolveu-se em seguida em espessa nuvem de fumaça. Em meio a fumaceira, tirou o chapéu de feltro e o casaco; pude então notar, com surpresa, que sobre as botas trazia chinelas. Continuando a fumar, passou em revista uma pilha de ervas, que retirou de uma caixa de metal semelhante às usadas pelos botânicos.


Atrevi-me, para iniciar conversa, a fazer-lhe algumas perguntassobre as ervas que pareciam interessá-lo tanto.


- O senhor não é muito forte em botânica – respondeu-me ele à meia voz. – Senão, teria visto logo que são plantas exóticas; estas foram colhidas na América, nas cercanias do famoso vulcão
Chimborazo.


A entonação de sua voz produziu em mim uma espécie de comoção magnética. Senti que as palavras morriam-me à flor dos lábios e pareceu-me que, por desconhecidos que fossem, os traços deste homem haviam aparecido nos sonhos de minhas noites agitadas.


Minha preocupação foi interrompida pelo ruído de novo golpear ansioso nas vidraças da taverna. O hospedeiro abriu a porta, mas o recém-chegado gritou de fora, antes de entrar:


- Não se esqueça de cobrir bem o espelho!


- Bem, bem – disse o hospedeiro, prendendo uma toalha ao caixilho do espelho – eis que chega o general Suwarow.


O general nada tinha de belicoso. Entrou saltitante, com passos pesados, descrevendo uma série de ziguezagues. Era baixinho, todo envolto num capote pardo de mangas largas, dentro do qual parecia, contudo, tremer de frio.


Veio sentar-se à nossa mesa, colocando-se entre o botânico de Chimborazo e eu. Mas as nossas cachimbadas o incomodavam e, voltando-se alternadamente para cada um de nós, queixou-se da fumaça e lamentou ter esquecido seu rapé.


Eu trazia comigo uma tabaqueira de aço polido, muito nova e brilhante. Apressei-me a oferecê-la a ele, delicadamente. Apenas a viu, cobriu o rosto com ambas as mãos e gritou:


- Com todos os diabos! Esconda este maldito espelho!


Sua voz era convulsa e todo o seu corpo tremia. Julguei-o louco. Serviram-lhe vinho do norte. Eu o espiava furtivamente quando, de súbito, vi seu rosto mudar de expressão e cor, como as imagens de uma lanterna mágica.


Desta vez, um suor gelado inundou-me a fronte; senti um medo terrível, não me pejo de confessá-lo.


"Este general Suwarow – disse comigo mesmo – não será Satã disfarçado, que vem me tentar?"


Enquanto eu dava curso às suposições mais fantástica, o ilustre personagem das ervas passava o seu tempo a espevitar a candeia com extremo cuidado e o pequeno se levantara para arrumar melhor o pano que velava o espalho. Essa bizarria não era de molde a tranqüilizar-me, quanto às suas faculdades mentais. Ambos se puseram em seguida a conversar sobre um jovem pintor que expusera recentemente um magnífico retrato de mulher.

- Sem dúvida alguma – dizia o magricela – é uma obra maravilhosa; pode-se dizer que o retrato é a imagem do modelo.


- Imagem? Imagem? Que animal estúpido poderia se apoderar de uma imagem, a não ser o diabo em pessoa? – gritou o general, dando um pulo na cadeira. – Mostre-me uma imagem roubado a um espelho – desafio-o a fazê-lo – e darei um pulo de quinhentas toesas de altura!

Nesse instante o magricela, pouco lisonjeado com a tirada de seu interlocutor, levantou-se e, passando a mão sob o queixo, disse com um sorriso amargo:


- Calma, meu pequeno, não te faças violento. Os movimentos muito bruscos me impacientam facilmente e eu poderia atirar-te pela janela...


O general, pestanejante, apanhou o chapéu, ergueu-se e recuou até a porta.


- Peste de homem! – disse, fazendo reverências e saltitando de maneira cômica – diabo raivoso, passa bem. Se não posso ver-me ao espelho, conservarei, ao menos, minha sombra, enquanto tu, meu caro... Bem, aqui ficam meus cumprimentos!...


Dito isso, desapareceu, deixando o botânico num estado de consternação difícil de descrever.


A idéia de um homem sem sombra me causava espécie. Vi-o partir também em seguida. Ao atravessar a sala, seu corpo não projetava sombra alguma.


Lembrando-me então do famoso Peter Schlemihl, esse Judeu Errante da Alemanha, corri atrás dele. Mas apenas atravessara a porta quando o hospedeiro me deu um empurrão, gritando:


- Que o diabo leve todos os fregueses de vossa espécie e Deus permita que nunca mais vos veja!


Quanto ao magricela, não consegui alcançá-lo. Com três passadas, desaparecera rua abaixo.


Eu havia esquecido minha chave no bolso do casado. Era-me, pois, impossível entrar em casa. Decidi a pedir asilo a um de meus amigos, o proprietário do Águia de Ouro. O porteiro não me fez esperar e fui conduzido a um belíssimo aposento, enfeitado com um grande espelho recoberto por uma cortina de sarja verde. Não sei porque me veio o capricho de levantar a cortina. Vi-me refletido no espelho, tão pálido e tão desfeito que mal consegui me reconhecer; depois, parecendo-me que, do fundo do espaço refletido pelo espelho, vinha avançando para mim uma forma indecisa e vaporosa.


Ao fixar os olhos nessa aparição, acreditei ver... sim, era Ela mesma, a figura adorada de Júlia.!


- Ó, minha querida, voltas para aquele que não pode viver sem ti? Um profundo suspiro me respondeu. Tal suspiro saiu das dobras do cortinado que escondia a alcova. Corri para o leito e deixo à vossa imaginação a tarefa de figurar o que devo ter sentido ao encontrar nele deitado, o homenzinho a quem o hospedeiro da taverna chamara general Suwarow.


Esse bizarro personagem sonhava em voz alta e seus lábios, contraídos por uma emoção penosa, pronunciavam um nome que me fez bater o coração mais depressa:


- Giulietta!... Giulietta!


Sacudi vivamente o homenzinho até acordá-lo.


- Com quantos diabos resolveu ocupar – disse-lhe – o quarto que me havia sido destinado?


- Ah! senhor – retorquiu, abrindo os olhos e estirando os braços – como lhe sou grato por haver interrompido o pesadelo que me oprimia! Uma rápida explicação foi quanto bastou para eu descobrir que o porteiro havia-se enganado ao levar-me para aquele aposento. Pedi desculpas ao general e começamos a conversar.


- Devo ter-lhe parecido – disse o desconhecido – bem inconveniente ou louco esta noite, na taverna. Mas o senhor será indulgente para comigo se alguma vez lhe aconteceu experimentar sensações inexplicáveis.


- Ah! meu caro senho – repliquei – poder-se-ia dizer de mim outro tanto; pois olhe, não faz muito tempo que revendo Júlia...


- Júlia! Que nome acaba o senhor de pronunciar! – gritou o homenzinho, jogando-se sobre o travesseiro. – Oh! cale-se, pelo amor de Deus, deixe-me dormir e não esqueça de cobrir o espelho.


- Mas como – continuei – o nome de uma mulher que o senhor certamente não conhece pode impressioná-lo tanto? Quer-me parecer que a expressão do seu rosto altera-se a cada instante. Vamos, acalme-se e consinta que eu repouse, até o amanhecer, ao seu lado. Tratarei de não incomodá-lo.


- Não, pode ficar com o quarto todo. Vejo que para mim não existe calma nem repouso possíveis. O senhor pronunciou o nome de Júlia... Júlia!


Giulietta!... É muito estranho. Estaremos unidos pela fatalidade, sem sabê-lo, no mesmo infortúnio?... Embora eu tenha talvez de afligilo mortalmente, não posso evitá-lo. Devo confessar a causa do meu infortúnio.


Acho que isso me aliviará.


O homenzinho deslizou para fora do leito e dirigiu-se para o espelho, do qual retirou a cobertura. Todos os objetos e luzes do quarto, assim como minha figura, nele se refletiram nitidamente. Mas a imagem do general Suwarow nele não aparecia.


- Veja – continuou ele com voz plangente – se sou ou não muito infeliz? Pedro Schlemihl vendeu sua sombra ao Diabo; pois bem, eu, eu dei minha imagem a Giulietta, que nunca mais mo devolverá! Meu Deus! Meu Deus! que fatalidade!


Fiquei estupefato com a narrativa. Em meu coração, o horror se misturava à piedade.


O homenzinho, entregue completamente à sua dor, jogara-se no leito convulsivamente; mas, dali a pouco, estava roncando. O ruído que fazia acabou por me fazer mergulhar numa sonolência irresistível. Apaguei as luzes e estendi-me ao seu lado, sem despir-me, decidido a esperar o amanhecer.


A excitação do meu sistema nervoso atingira o máximo; meu espírito turbilhonava num labirinto povoado de fantasma indescritíveis. Pareceu-me, de repente, que o mundo diminuía, como aquelas casas de bonecas. Vi todos meus amigos mudados em homúnculos de açúcar. Depois todas essas figuras cresceram desmesuradamente e, no meio delas, apareceu Julia, que me estendia um copo cheio de ponche, dizendo:


- Bebe, meu anjo, bebe este licor divino!


Vi pequenas chamas azuladas tremularem à borda do copo. Estava prestes a agarrá-lo quando uma voz gritou atrás de mim:


- Não beba! Não beba! É o veneno de Satã!


Voltei-me e reconheci o general Suwarow, que se ria debaixo do meu nariz. Julia continuava com suas provocações; seu olhar me queimava, o timbre de sua voz me dava vertigens.


- Por que tens medo? – dizia ela – Não nascemos um para o outro por toda a eternidade? Não me deste tua imagem em troca de um beijo?


Eu me sentia morrer e estendi o braço para receber a taça mágica no fundo da qual desejava afogar minha alma.Mas o pequeno Suwarow gritava, em voz mais forte ainda:


- Não beba! Não beba! Essa bela moça que lhe sorri é o diabo em pessoa; se tocar os lábios a taça, o sortilégio desaparecerá, restando somente a realidade da perda.


Julia continuava a insistir e a embriagar-me com sua sedução; não sei o que iria me acontecer quando, de súbito, todas as figuras deaçúcar cândi se puderam a dançar em torno de mim, com uma tal rapidez que não discerni mais nada. Esse pesadelo não terminou senão às onze horas da manhã, quando um criado do Águia de Ouro veio despertar-me para avisar que o desjejum estava servido. O general Suwarow se levantara muito cedo, pagara sua despesa e deixara, endereçado a mim, um pacote lacrado dentro do qual havia um manuscrito, de letra miúda e de difícil decifração, no qual se narrava a singular história que se segue. Era, talvez, a sua história.

II


Numa bela manhã, mestre Erasmo Spickherr viu-se, pela primeira vez, em condições de satisfazer a mais ardente paixão de sua vida. Acabara de juntar uma pequena herança, da qual retirou uma soma suficiente para cobrir os gastos de uma viagem à Itália. Na hora da partida, sua jovem esposa acompanhou-o, com o filho nos braços, até a carruagem:


- Adeus! – gritou ela, os olhos úmidos de lágrimas – querido Erasmo! Pensa sempre em mim, que ficarei em casa, e tem cuidado para não perder a boina de viagem, dormindo com a cabeça para fora da janela da carruagem.


Em Florença, Erasmo travou conhecimento com um alegre grupo de compatriotas seus, que jogavam dinheiro fora e levavam a vida mais desvairada que qualquer artista ou filho-família jamais viveu sob o tépido sol da Itália.


Eram festas e banquetes, noite e dia, em mansões esplendorosas, com mulheres trajando costumes fantásticos, cuja elegância e riqueza de cores emprestava-lhes o aspecto de flores animadas. Somente Erasmo, fiel à lembrança de sua esposa legítima, não se arriscava, malgrado seus 27 anos, a nenhuma excursão além do círculo da fé conjugal.


Certa noite, quando esses pândegos estavam reunidos numa orgia regada a vinho, um deles, Frederico, o mais fogoso do grupo, rodeando com o braço o talhe esguio da amante, e erguendo seu copo onde brilhava um líquido dourado, ergueu um brinde incandescente à beleza das rainhas da noite, acrescentando:


- Quanto a ti, meu pobre Erasmo – disse a Spickherr – entristecenos profundamente com essa fisionomia fúnebre. Bebe e cantas como um coveiro e portas-te de modo lamentável para com nossas damas.


- Juro-te, meu caro – respondeu Erasmo – que é meu dever permanecer indiferente ao encanto dessas damas. Deixei na pátria minha digna esposa e, quando se é, como eu, pai de família... A estas palavras, ditas pelo pobre Erasmo com solene gravidade, os presentes caíram num frouxo de riso. A amante de Frederico, depois de lhe terem dito em italiano o que dissera Erasmo, voltou-se para o frio alemão e disse-lhe:


- Toma cuidado. Se visses Giulietta a neve do teu coração se fundiria como gelo ao sol.


No mesmo instante um ligeiro roçagar de sedes por entre a folhagem anunciou a aparição de uma jovem de esplendorosa beleza. Um vestido branco, que lhe punha a descoberto as espáduas níveas e a garganta magnífica, caía em dobras sedutoras sobre seu talhe de fada. Sua cabeleira, perfumada, em ondas de ébano, enquadrava, com um encanto inefável, o oval admirável de um rosto de madona. Pedrarias cintilantes adornavam-lhe os braços e o colo.


- É Giulietta – exclamaram as raparigas.


- Sim, sou eu – disse, com um sorriso angélico, a bela desconhecida. – Permitis que vos faça companhia por um instante? Bem, vou sentar-me ao lado deste alemão carrancudo que não diz
uma palavra.


Em meio aos sussurros de suas rivais em beleza, a recém-chegada tomou lugar ao lado de Erasmo, que pensava sonhar. A vista de tantos encantos, sentia o coração pular-lhe; seu olhar se fixava em Giulietta como que aterrorizado. A bela florentina apanhou da mesa uma taça
cheia e entregou-a a ele dizendo:


- Aprazer-te-ia, severo estrangeiro, que eu fosse a senhora dos teus pensamentos?


Erasmo enrubesceu; todo o seu ser vibrava; erguendo-se, como que impelido por uma mola, caiu diante dela, numa postura de adoração:


- Sim! – exclamou – é a ti que eu amo, anjo dos céus! Tua imagem morava em meus sonhos; tu me trazes a felicidade dos eleitos. Esta explosão fez crer aos presentes que Erasmo enlouquecera. Giulietta ergueu-o, pedindo que se acalmasse, e a alegre conversa recomeçou, mais animada. Solicitada a cantar, ela concordou, com graça esquisita. Sua voz magnética provocava sensações inéditas. As horas passaram como se fossem minutos.


Ao amanhecer, Giulietta decidiu retirar-se. Erasmo queria acompanhá-la, mas ela recusou e, indicando os lugares onde ele poderia reencontrá-la, desapareceu como uma sílfide. O pobre apaixonado não ousou segui-la e dirigia-se tristemente para casa quando, a uma esquina, encontrou um personagem alto e magro, trajando um costume escarlate pontilhado de botões de aço.


- Oh! Oh! – fez o desconhecido – que cara desconsolada tem o senhor Spickherr esta manhã! Os moleques da cidade vão correr atrás do senhor! Trate de esconder-se.


- Ei! Quem és tu, imbecil, para me falares dessa maneira? Segue teu caminho! Respondeu-lhe Erasmo.


Devagar, meu valente – continuou o homem de escarlate. – Mesmo que tivesses asas de águia, não alcançarias Giulietta esta manhã!


- Giulietta! Que quer dizer? – retorquiu Erasmo, fazendo meia volta para agarrar seu interlocutor. Este, porém, desembaraçando-se com uma pirueta, eclipsou-se como um fogo fátuo.


Erasmo viu novamente Giulietta. A bela rapariga o recebeu de bom grado, mas sem lhe permitir quaisquer liberdades. Entretanto, quando ele lhe falava, fogoso e apaixonado, ela lhe lançava, às furtadelas, olhares cheios de fascínio. Ele abandonou a companhia ruidosa dos amigos para segui-la por toda a parte, como se não pudesse viver senão do mesmo ar que ela respirava.


Certo dia, reencontrou Frederico; não pôde escapar-lhe, e este lhe disse:


- Meu caro Spickherr, eis enfeitiçado pelos filtros de uma nova Circe!.Ainda não compreendeste que Giulietta é a mais dissoluta das criaturas?


- Ignoras então a fieira de histórias que se contam sobre ela? É preciso que sejas muito tresloucado para esqueceres tão depressa aquela boa esposa de que falavas com tanta ternura.


Erasmo escondeu o rosto entre as mãos e não pôde conter as lágrimas.


- Vamos – continuou Frederico – deixa essa paixão que te perde e vem comigo. Deixemos Florença sem perda de tempo!


- Sim, sim, imediatamente – exclamou Erasmo. Partamos hoje mesmo.


Os dois amigos caminhavam apressadamente quando o homem de escarlate cruzou-lhes, de súbito, o caminho:


- Vamos, senhor – disse a Spickherr – apresse-se pois a bela Giulietta espera-o com ansiedade.


- Vá para o diabo, animal! – exclamou Frederico – Este é o signor Dapertuto, muito conhecido como doutor em milagres; um charlatão maldito que vende a Giulietta drogas infernais...


- Quê! – interrompeu Spickherr – então este imbecil freqüenta a casa de Giulietta?


Antes que seu amigo pudesse replicar, ouviu, ao passarem sob um balcão, a voz argentina de Giulietta que o convidava a subir. A magia desse apelo perturbou a resolução de Erasmo. Mais embriagado do que nunca apela paixão, deixou-se de novo prender pela amorosa algema e acompanhou a bela cortesã a uma vila de recreio para onde ela se dirigia em busca de prazeres. Um jovem italiano, notavelmente feio de rosto e grosseiro de maneiras, se achava lá e perseguia Giulietta com seus galanteios. Erasmo sentiu todas as serpentes do ciúmes morderem-lhe o coração e afastou-se com ar sombrio. Giulietta correu atrás dele:


- Vamos, querido – disse-lhe languidamente – não és todo meu?... Ao mesmo tempo em que falava, aproximou-se dele e roçou-lhe a face com um beijo.

- Para sempre! – exclamou Erasmo, abraçando-a inflamado de amor.


A florentina escapou-lhe habilmente e lançou-lhe um olhar cuja expressão quase o fez perder o pouco da razão que lhe restava. Voltaram ambos para a festa. O jovem italiano havia os acompanhado com os olhos e, fazendo-se de rival ofendido, vingou-se com amargos sarcasmos contra os alemães. Erasmo, que se irritava facilmente, ameaçou o italiano de rude correção. Este fez brilhar um punhal. Não podendo mais se conter, Erasmo saltou-lhe à garganta, derrubando-o
por terra e assentou-lhe na cabeça um pontapé tão violento que o desgraçado perdeu os sentidos. Mas o estupor que esse acontecimento lhe causou deu-lhe também vertigens.


Quando voltou a si estava no boudoir de Giulietta.


- Meu pobre e querido alemão – dizia ela – quero salvar-te. Mas é preciso que abandones Florença o mais depressa possível. É preciso que me deixes para sempre, a mim que te amo tanto! Não nos veremos mais.


- Ah! – exclamou Spickherr – antes morrer de mil mortes. Mesmo que eu devesse perder a alma, sou teu para sempre!


- Oh! – continuou Giulietta – voltarás para tua esposa, a quem também amas e, ao lado dela, me esquecerás logo.


Ambos se achavam sentados diante de um magnífico espelho veneziano. A florentina prendeu Erasmo dentro de seus braços ebúrneos.


- Ah! se ao menos – disse ela com olhos úmidos – se ao menos me deixasses tua imagem, enquanto esperássemos que o amor nos reunisse novamente...


- Minha imagem!... que queres dizer?... Minha imagem!... – balbuciou Erasmo, desconcertado. – Mas como poderias guardá-lo, se ele é inseparável de mim?


- Recusas, então? – disse ela, com um suspiro fundo. – Nada me restará da lembrança, nem mesmo esta fugitiva imagem que me sorri do fundo do espelho!


E as lágrimas tombavam como gotas de fogo, sobre o rosto do jovem alemão.


- Choras, Giulietta, minha adorada! – exclamou – Ah! já é preciso fugir para subtrair-me à desgraça que nos separaria para toda a vida, que, ao menos, eu te possa deixar, para a eternidade, essa imagem cuja presença adoçará tuas recordações!...


Apenas acabara de falar, quando, lançando um olhar ao espelho, não mais viu a sua imagem. A mesma Giulietta, que ele apertava ao coração, esvaneceu-se como nuvem. Vozes fantásticas ressoavam no silêncio do apartamento deserto.


Erasmo, transido de espanto, sentiu um véu gelado descer-lhe sobre os olhos; procurou a porta aos tateios, como um embriagado, abriu-a com dificuldade e desceu a escada num silêncio cheio de horror. Apenas alcançara a rua quando braços o agarraram no meio das trevas e o meteram numa carruagem, que partiu velozmente.


- Não tenha medo – disse-lhe uma voz. – Giulietta confiou-o aos nossos cuidados. Sabe que aquele estúpido italiano recebeu uma de que jamais se esquecerá? Esse acidente me entristece, pois Giulietta amava o senhor. No momento, não lhe resta alternativa senão escapar às garras da justiça e, se realmente insistir em não deixar Florença, sei de um meio de escondê-lo de todos os olhares...


- Oh! caro senhor – respondeu Erasmo, soluçante – como poderia fazê-lo?


- Nada mais fácil – continuou o desconhecido. – Tenho um segredo para tornar as pessoas irreconhecíveis, alterando-lhes os traços fisionômicos. Quando amanhecer, faremos uma tentativa e, olhando-se no espelho, o senhor mesmo será o juiz.


- Deus! – exclamou Erasmo – que horror!


- Não vejo nada de horrível – replicou o homem oculto. – Arranjarlhe- ei uma imagem muito delicado.


- Ah! Devo confessar que ... que...


- Que houve?... Terá por acaso esquecido sua imagem em casa de Giulietta? Se assim for, não há o que fazer senão voltar à sua pátria. Creio que sua querida esposa se importará pouco com o que perdeu, desde que o tenha de volta em carne e osso.


A certa altura, a carruagem cruzou com um bando de alegres convivas, que voltavam para casa a luz de tochas. Erasmo olhou para seu companheiro de viagem e reconheceu nele o homem de escarlate, a quem seu amigo Frederico chamava Dapertuto. Num átimo, saltou do veículo e correu à toda velocidade atrás dos condutores de tochas, entre os quais estava Frederico.


- Salva-me! – disse-lhe ao ouvido, com voz opressa – fiz uma loucura!


Mas não acrescentou que perdeu sua imagem. Frederico levou-o para casa e, sem perda de tempo, arranjou-lhe meios de deixar Florença a cavalo, ao amanhecer.


O infeliz Spickherr escreveu a história dessa triste viagem. Suas aventuras são comoventes. Certo dia em que, morto de fadiga, desejava repousar numa hospedaria, cometeu a imprudência de se colocar diante de um espelho. O garçom, que servia a mesa, olhando por acaso para o vidro e não vendo refletido nele a imagem do freguês, comunicou esse fato surpreendente a um vizinho; este contou-o a outro e logo vários dos presentes começaram a gritar: - Quem é este homem sem imagem? É um maldito, um enfeitiçado, ou o Diabo em pessoa!

Erasmo salvou-se fechando-se no quarto onde contava poder passar a noite. Todavia, logo depois vieram agentes da polícia dizerlhe que, em nome dos magistrados, deveria ou mostrar sua imagem ou deixar a cidade sem perda de tempo.


Forçado a fugir através dos campos, para evitar as caravanas que cruzavam o caminho, ele não entrava nos albergues senão ao cair da noite; pedia ao proprietário para cobrir os espelhos; foi por isso que recebeu a alcunha de general Suwarow, porque, ao que se dizia, este general tinha a mesma mania.


Chegou, por fim, à sua cidade natal. A esposa o recebeu de braços abertos e ele acreditou, por um momento, que sua desgraça chegara ao fim. Tomando toda sorte de precauções, conseguiu dissimular a perda de sua imagem. Conseguiu mesmo esquecer Giulietta. Mas, certa noite em que brincava com o filho, este tendo sujado as mãos na chaminé do fogão, comprimiu-as contra o rosto do pai, gritando alegremente:


- Veja, papai, como senhor ficou lambuzado!


Depois, escapando-se dos braços do pai, apanhou um espelho, colocando-o diante dele e espiando por cima do seu ombro. Antes que Spickherrr pudesse se erguer, o pequeno, não vendo no vidro a imagem do pai, deixou cair o espelho e fugiu, chorando. Ao ruído, apareceu a mãe.


- Que é que me diz a criança? – perguntou ela.


- Ei! Por Deus – respondeu Spickherr, com um riso forçado – ele te diz que não tenho imagem. Pois bem! Que importa? Uma imagem não é mais que uma ilusão, minha querida; quem se olha ao espelho, peca por vaidade; Deus me livre desse pecado!


A pobre mulher agarrou o marido pela mão, arrastou-o, como se arrasta um culpado, até diante do espelho e, dando-se conta da horrível verdade, transformou-se numa megera furiosa.


- Vai embora – gritou – vai para bem longe daqui, maldito; deves ter feito algum pacto com o Demônio! Ou talvez nem sejas meu Erasmo: és um espírito do inferno! Persignou-se inúmeras vezes. Erasmo, desesperado, abandonou a casa a correr e foi se refugiar numa campina deserta. Enquanto errava ao azar, roído de mil angústias, a imagem de Giulietta lhe apareceu de repente, mais bela do que nunca.


- Ai – disse ele – que te fiz para que me persigas? Minha mulher me abandonou, não tenho mais nenhum afeto sobre a terra; tem piedade, Giulietta, tem piedade de mim. Onde te reencontrarei agora?


- Bem perto daqui, meu caro, pois ela está ansiosa por revê-lo – respondeu uma voz atrás dele. Voltou-se, muito surpreso, e deu de cara com o odioso Dapertuto, que o mirava com olhar sardônico.


- Sou seu humilde servidor – continuou o homem – e afirmo-lhe que tão logo Giulietta esteja certa de poder possuí-lo em pessoa, terá imenso prazer em devolver-lhe a imagem que, evidentemente, não pode saciar seu amor.


Erasmo estava fora de si.


- Leve-me a ela – exclamou – e lhe pertencerei sem qualquer reserva...


- Perdão – disse Dapertuto – isso exige o cumprimento de uma formalidade. O senhor está comprometido por ligações que devem ser rompidas, visto que Giulietta quer possuí-lo sem partilha. Ora, sua mulher e seu filho...


- Ah! minha mulher... meu filho...


- É preciso desembaraçar-se deles; oh! mas de uma maneira muito simples, que não o comprometerá. Tenho aqui, dentro de um pequeno frasco, um elixir, do qual duas gotas apenas livram a pessoa de toda sorte de importunos. Estes não farão, garanto-lhe, sequer uma careta. Tome, meu caro, isto exala um ligeiro perfume de amêndoas que provoca um sono... um sono definitivo.


- Miserável! – urrou Erasmo – Ousas então propor-me tal crime?


- Éh! Quem fala de crime? – replicou Dapertuto. – O senhor deseja rever Giulietta e lhe ofereço o meio, eis tudo. Tome logo o frasco e não banque a mulherzinha.


Erasmo, preso de vertigens, achou-se de súbito com o frasco na mão e diante do leio no qual sua mulher se agitava nas aflições de um pesadelo. O pobre marido sentiu o coração partir-se-lhe no peio ante este espetáculo. Abriu a janela, jogou o frasco bem longe e foi-se fechar no quarto vizinho, para chorar seu destino. A lembrança de Giulietta veio atormentá-lo.


- Anjo ou demônio – gritou ele – causa da minha desgraça. Pois bem! Aceito meu destino: aparece mais uma vez diante de meus olhos; quero morrer revendo-a!


Nesse instante, soou meia-noite. À última pancada do relógio, Giulietta apareceu.


- Meu bem amado – disse-lhe – guardei fielmente tua imagem: eilo! O véu que cobria o espelho tombou e Erasmo viu sua imagem enlaçada a da bela florentina.


- Oh! se me amas, devolve-me a imagem; devolve-me, por piedade! – disse ele, caindo de joelhos. – Mas não posso comprá-lo ao preço do crime que me exige Dapertuto!


- Escuta – continuou Giulietta – não podemos nos unir senão quando teus laços estejam rompidos. Um padre os atou; somente tu podes renunciar a eles. Mas não é preciso que o faças pessoalmente; toma apenas este papel e escreve em cima que renuncias à tua família terrestre para me pertencer eternamente...

Erasmo tremia. Giulietta o beijava ardentemente. Subitamente, viu erguer-se de trás dela a figura de Dapertuto, que lhe apresentava uma pena de ferro. Nesse mesmo instante, uma veia de sua mão esquerda rebentou e o sangue começou a jorrar.


- Escreve! Escreve! – dizia Dapertuto, com voz metálica.


- Escreve meu bem-amado! – dizia Giulietta, cujos véus haviam caído para oferecer aos olhares fascinados de Erasmo todos os tesouros da mais voluptuosa das belezas.


Ele tomou da pena, molhou-a no sangue e ia assinar, quando um fantasma pálido entrou no quarto e pronunciou estas palavras, com voz sepulcral:


- Erasmo! Erasmo! Queres dar tua alma ao Diabo? Em nome de Jesus, pára...


Erasmo reconheceu a voz de sua esposa.


Ao ser pronunciado o nome sagrado, Giulietta mudou de aspecto e transformou-se num espectro de fogo.


- Para trás, Satã! – gritou Spickherr – volta ao inferno de onde saíste!


Logo em seguida um tremor de fazer medo estremeceu a casa; o chão se abriu e Giulietta e Dapertuto desapareceram numa nuvem de vapor sulfuroso. Depois, tudo voltou ao silêncio.


Quando Erasmo, aturdido, conseguiu coordenar as idéias, a luz do dia penetrava no quarto. Voltou para junto da esposa. Esta já estava desperta e brincava com o filho na cama.


- Meu amigo – disse-lhe ela com doçura – agora sei da aventura que tiveste na Itália. Estou contristada; vê como são astutas as partidas pregadas pelo Demônio, que te roubou a imagem que eu tanto gostava de ver sorrindo para mim, no espelho! De hoje em diante não podes mais continuar a ser um respeitável chefe de família; todos de apontarão com o dedo. Sugiro que te ponhas a caminho e comeces a viajar em busca do tua imagem. Tão logo o encontres, conforme espero, apressa-te em voltar. Esperar-te-ei com impaciência e rever-te-ei com alegria. Beija-me e parte com Deus. Lembra-te de enviar, de vez em quando, algum confeito ou brinquedo ao teu filho, para que ele não te esqueça.


Spickherr, o coração opresso, beijou a esposa e o filho, apanhou o bordão e pôs-se a caminho. Encontrou certo dia o famoso Pedro Schlemihl, que havia perdido a sombra. Os dois desafortunados propuseram-se viajar juntos; Spickherr entrava com a sua sombra e Schlemihl com sua imagem. Mas não conseguiram chegar a nenhum acordo e, até hoje, ninguém sabe o que lhes aconteceu.





Fonte: Virtual books on line

2 comentários:

Anônimo disse...

Bem, o conto é meio complicado, tratando-se do que se vê no espelho, pode ou não refletir a verdadeira face, a alma da pessoa que se lhe mire com atenção Faz parte da Alta Aagia essa experiência ante o espelho. Um bom argumento para temas fantásticos.

Anônimo disse...

gosto muto deste conto Henry. Inspirou-sme a escrever um que já estou a preparar.

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