MELISSA
Henry Evaristo
Henry Evaristo
Melissa procurou o terceiro banco, aquele mais distante e além dos ruídos alegres do fim da tarde, porque não queria que sua profunda melancolia corresse o risco de ser contaminada pelo ritmo frenético e cheio de luz da vida noturna daquela cidade. A felicidade, e quaisquer que fossem suas manifestações no mundo físico, não a interessavam naquele momento. Não se sentia merecedora de mais nenhuma dose do ardor com que se impregnavam as vidas de todos aqueles que por ali evoluíam. Sentindo uma incontrolável dor em sua alma, Melissa buscava a solidão. Criatura condenada e perdida que se sentia, pensava numa morte impossível a todo instante.
Do terceiro banco ela espiou as vagas escuras, que se formavam adiante num movimento contínuo, imaginando se até mesmo ali suas agruras a perseguiriam. Ficaria livre dos homens e mulheres ao misturar-se a elas? Ficaria novamente imaculada? Se lhe desapareceriam todas as lembranças ruins? Todos os feitos hediondos? Seria ela liberta de suas dívidas com Deus?
Olhou para o céu e depois para as montanhas mais além. E chorava discretamente quando se questionou sobre o porquê de sua maldição. Tudo no mundo lhe transmitia um odor aziago e até mesmo o toque de sua pele (por baixo da minissaia) na superfície fria da madeira do banco espalhava por seu corpo ondas de agonia indescritíveis. Sentia vontade de vomitar, de explodir, de expelir de seu corpo séculos e séculos de matérias tomadas à força. Algo dentro dela gritava com potência titânica e todos os seus sentidos estavam amplificados. Logo os ponteiros de seu relógio avançariam mais para as horas escuras e solitárias e, por mais uma noite, perderia a batalha contra seu monstro interior.
Impotente e resignada, Melissa se levantou; e se jogou para cima com um movimento brusco. Seu corpo flutuou pelos ares e foi empoleirar-se no alto de um velho farol abandonado. De lá ela via a tão longínqua vida a circular pelas avenidas e praças. Lá ela esperou até que a madrugada lhe apresentasse o primeiro homem de passos trôpegos que resolvesse se aventurar por alguma viela deserta; que adormecesse de janelas abertas; ou que se detivesse na areia da praia para contemplar o grande oceano. Lá ela esperou amaldicoando-se por isso, mas, ao mesmo tempo, sentindo que cada vez mais sua consciência se esvaía; se afastava da superfície deste mundo, cedendo lugar a um horror irracional feroz, brutal e faminto.